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quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

Entrevista Adriano Pires, Dir.do Centro Brasileiro de Infra Estrutura (CBIE).



Enfrentando escassez de fornecedores nacionais, Petrobras e BNDES se unem para fazer com que empresas de bens de consumo e autopeças produzam para o pré-sal




Preocupados com a capacidade da indústria naval brasileira de atender à forte demanda por equipamentos de exploração de petróleo, a Petrobras e Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) saíram em busca de empresas dispostas a fazerem frente ao aumento da demanda decorrente do pré-sal e se tornarem fornecedoras do setor de óleo e gas.

O alvo inclui até companhias que não têm nenhuma experiência no setor, como as gaúchas Tramontina e a Randon – a primeira fabrica talheres e utensílios de aço inoxidável e a segunda atua no setor de autopeças. A empreitada visa amenizar os problemas enfrentados pela Petrobras para cumprir a cota de conteúdo local nos projetos, que é exigida pela Agência Nacional do Petróleo (ANP) no momento em que as empresas exploradoras de petróleo participam do leilão de concessão. Segundo a ANP, o índice de nacionalização ideal é de 65%.


A empreitada do BNDES e da Petrobras é considerada uma “atitude desesperada”, na avaliação de Adriano Pires, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e diretor do Centro Brasileiro de Infra Estrutura (CBIE). “Além de transformar a nossa indústria em uma das mais caras do mundo, corremos o risco de ter empresas ineficientes que não conseguirão competir com as estrangeiras”, afirmou o especialista ao site de VEJA.

Segundo Pires, a produção de petróleo no Brasil tem aumentado em velocidade aquém do esperado e uma das razões é a falta de capacidade da indústria naval brasileira em fornecer equipamentos. “O governo, com essa política de conteúdo nacional mínimo, condiciona a dinâmica da produção de petróleo à capacidade da indústria local, que é baixa”, diz.

A parceria entre a Petrobras e o BNDES ilustra uma situação alarmante?
Toda a produção de petróleo da Petrobras está atrasada, por vários motivos. Falta dinheiro na empresa para fazer investimentos tão elevados; mão de obra qualificada para o setor; e empresas brasileiras fornecedoras de equipamentos. O governo, com essa política de conteúdo nacional mínimo, condiciona a dinâmica da produção de petróleo à capacidade da indústria naval nacional, que é incipiente. E essa política gera distorções no mercado. No desespero, o BNDES começará a subsidiar aquelas empresas que não têm experiência e tecnologia na área, o que acabará por transformar a nossa indústria de serviços e produtos off shore em uma das mais caras do mundo.

Quais são os riscos dessa empreitada? Além de impactar na competitividade dos produtos, a atitude do governo faz com que corramos o risco de ter empresas ineficientes. Um exemplo de como isso já acontece é o navio João Cândido, encomendado pela Petrobras ao estaleiro Atlântico Sul, que não saiu do lugar até hoje. O navio demorou 50 meses para ser construído, enquanto um navio de mesmo porte em estaleiros estrangeiros leva apenas 12 meses. Sem contar que custou 180 milhões de dólares, enquanto o custo lá fora é de 60 milhões de dólares. Isso atrasa a produção de petróleo nacional, que já tem crescido muito lentamente.

Hoje, a Lupatech, que fornece equipamentos para exploração de petróleo, está quebrando, porque, em 2008, a empresa acreditou nas promessas da Petrobras de que o volume de encomendas ia crescer muito mais do que realmente cresceu.

É possível comparar a política de conteúdo nacional na indústria do petróleo com o que o governo está fazendo no setor automotivo e de tecnologia, intensificando a produção de carros e tablets em território nacional? A essência da política é a mesma, mas não vai funcionar no setor petroleiro. O volume de investimentos necessário para explorar petróleo é muitas vezes maior do que o dinheiro usado para produzir tablets ou automóveis. São setores completamente diferentes. É uma indústria que necessita de alta sofisticação tecnológica e de mão de obra experiente, enquanto um tablet pode ser montado em qualquer país que disponha de uma força de trabalho barata, como as nações asiáticas.



Indústria naval brasileira pode se tornar a mais cara do mundo 


A indústria naval brasileira não sairia ganhando? É necessário incentivar essa indústria de alguma forma, mas com critério, e não com essa reserva de mercado. Caso contrário, atrasaremos ainda mais a produção e teremos a indústria mais cara e ineficiente do mundo. Sem contar o risco que uma empresa estrangeira corre ao vir ao Brasil fornecer para a Petrobras: como a estatal é praticamente o único comprador, se acontecer algo com a empresa, ela leva toda a cadeia junto.

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