O
impacto do incêndio na Estação Antártica Comandante Ferraz vai além do científico:
é político, também. Espera-se que, com esse acidente, a opinião pública seja
esclarecida sobre as atividades brasileiras na Antártida, e que o fato
repercuta no orçamento destinado às atividades de pesquisa no País
Estive
na Antártida em duas oportunidades: em 1986, na primeira troca de comando da
base e em 1996. Posso afirmar com certeza, sem medo de errar, que o trabalho
realizado pela Marinha Brasileira é fundamental para as operações naquele
continente. Desde aquela época, fala-se em corte de verbas para as pesquisas e
infraestrutura.
Os pesquisadores dizem que não houve sensibilidade da Comissão
Mista de Planos, Orçamentos Públicos e Fiscalização do Congresso Nacional para
separar mais recursos para os gastos com a Estação Comandante Ferraz e as
pesquisas na Antártida. De 2011 a 2012, os recursos previstos no Orçamento da
União para a Missão Antártica caíram de R$ R$ 75,1 milhões, previstos no
Programa Antártico Brasileiro (Proantar) para R$ 19,9 milhões, descritos no
programa temático Mar, Zona Costeira e Antártica.
Em balanço feito em novembro do ano passado, a
Frente Parlamentar de Apoio ao Programa Antártico verificou que nenhum real
previsto em emendas de deputados, senadores ou comissões para a missão
brasileira no continente tinha sido executado. O incêndio na base brasileira
foi uma fatalidade, cujas consequências seriam menores se o País desse
prioridade à Antártida. Vamos aguardar a perícia que está sendo realizada.
Hoje 27 países têm base cientificas na Antártida, onde
é proibida por Tratado qualquer pretensão militar. Mas há quem reivindique que
esse acordo que vigora desde 1961 seja revisto. Porém por que tanta atração por
um território onde a temperatura chega a 89 graus negativos, e os ventos chegam
a 300 km por hora?
A questão é saber se é necessário fazer grande
investimento na Antártida na construção de uma base mais moderna. Acredito que
seja. A Antártida é estratégica, não do ponto de vista militar, mas sim pelas
riquezas existentes no continente. Existem reservas minerais importantes. As
rotas transpolares é outro tema interessante. O continente é um ponto de encontro
dos oceanos Atlântico Sul, do Índico e do Pacífico. Ou seja, existem possibilidades
de serem criadas rotas comerciais importantes, mas é necessário garantir o
tráfego de navios. Estando na Antártida, torna-se tudo mais fácil para garantir
a participação nesse comércio. A pesquisa parou de receber recursos desde 2006,
foi reduzindo a cada ano. Para 2012, a previsão de recursos é de R$ 2 milhões, o que não deve pagar nem a manutenção
da base. A Antártida é tão estratégica para o Brasil quanto a preservação da Amazônia
ou do Atlântico Sul.
A Antártida é estratégica, não do ponto de vista militar, mas sim pelas riquezas existentes no continente
O continente que tem o tamanho da Europa é uma região cada
vez mais cobiçada por diversos países. Água potável, minérios como carvão, cobre,urânio
e talvez petróleo,fazem parte da riqueza desse gélido Continente. Diversos
países consideram que a Antártida possa ser no futuro fonte de conflitos. Por
exemplo: dentro do governo argentino, existe um debate sobre a necessidade de
haver lá presença ostensiva quando acabar a vigência do tratado antártico em 2041.
A Argentina considera que uma parte da Antártida faz parte de seu território. O
Chile considera chileno o lado oriental da Antártida, que a Argentina disse que
é própria, e que os chilenos chamam de território chileno antártico.
Chilenos e
argentinos reivindicam a posse dessa área argumentando que, além de suas bases,
a população que mora na região herdou a área dos colonizadores espanhóis.
Segundo eles afirmam, o Continente antártico foi descoberto muito antes da
expedição do norueguês Amundsen, em 1911, pelo
navegante Gabriel de Castilla que
chegou na região em 1603 partindo do porto chileno de Val Paraíso. Visitei a
estação chilena na Antártida, quando conheci dezenas de famílias as quais moram
no Continente há anos, formando comunidades para garantir uma parte no
território gelado.
Atualmente sete países reivindicam soberania na Antártida:
Argentina, Austrália, Chile, França, Noruega, Nova Zelândia e Grã Bretanha. Essas
reivindicações não são reconhecidas pela ONU, embora sejam mencionadas no
Tratado. Não é em vão que o Reino Unido está nas Malvinas, próximo ao
continente gelado. Em 1982,
argentinos e britânicos travaram a Guerra das Malvinas pela posse do território.
Apesar da vitória militar britânica no conflito, o governo argentino mantém a
reivindicação de soberania até hoje. Volta e meia reivindicam
a soberania sobre uma grande
parte do oceano da Antártida, um pedido que o governo de Londres considera
"uma salvaguarda para o futuro".
Sem falar na base
americana de McMurdo, a maior do continente, habitada na maioria por militares,
considerada uma
verdadeira "metrópole" para os padrões do Continente Gelado. A Estação Antártica Comandante Ferraz existe desde 1984. Até o incêndio,
ela era ocupada pelo Brasil 365 dias por ano. Sua destinação é a ciência, de
acordo com os tratados assinados pelo Brasil com as nações que compartilham o
território antártico. E que assim seja para o bem da humanidade.
DINIZ JÚNIOR, jornalista, 1° repórter da TV brasileira do sul do
Brasil a visitar o continente antártico a convite da Marinha do Brasil. Hoje,
atua como editor da Revista Conexão Marítima (RS)
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